domingo, 7 de janeiro de 2024

Projeto de Vida na BNCC: primeiras reflexões

    Desde 2017, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (LDB, Lei de nº 9.394/96) passou a exigir que os currículos do ensino médio considerassem a construção do projeto de vida dos estudantes como um dos objetivos da formação integral.
§ 7º Os currículos do ensino médio deverão considerar a formação integral do aluno, de maneira a adotar um trabalho voltado para a construção de seu projeto de vida e para sua formação nos aspectos físicos, cognitivos e socioemocionais. (Incluído pela Lei nº 13.415, de 2017)

    Entretanto, a terceira versão da Base Nacional Comum Currícular (BNCC), versão que está atualmente em voga, apresenta pouquíssimos elementos sobre projeto de vida ao longo de suas 600 páginas. Quando traz o tópico, não aponta necessariamente quais bases epistemológicas são as que precisariam ser seguidas, considerando que a BNCC é o documento normativo que direciona todos os estados brasileiros e distrito federal na elaboração de seus documentos currículares.

    Como a BNCC não trouxe essas informações de forma completa, cada gestão estadual desenvolveu e adotou diversas perspectivas de projeto de vida na elaboração de seus documentos curriculares, ora estabelecendo projeto de vida como disciplina - com ou sem atribuição de notas, ora como componente transversal às outras disciplinas, ora como projeto, ou como uma trilha, etc. A ausência de documentos oficiais por parte do Ministério da Educação (MEC), até agora, causa bastante desconforto e insegurança nas professoras e professores.

    Sem o MEC na liderança dessa discussão, o espaço ficou aberto para que institutos estabelecessem parcerias público-privadas com as secretarias estaduais e municipais de educação, objetivando a venda de "pacotes" sobre projeto de vida dos mais variados modelos, nem sempre rigorosos o suficiente e com as evidências científicas fundamentais para a presença de qualquer conteúdo dentro da escola, que é um dos primeiros e, se não, o principal espaço de divulgação científica que existe hoje em nosso país. Com isso, não digo que toda parceria rendeu frutos ruins, mas que nem todos os frutos dessas parcerias foram bons.

    Sobre essa questão curricular de projeto de vida entre BNCC e currículos estaduais, escrevi um resumo expandido para o Colóquio da Rede de Pesquisa sobre o Ensino Médio (REPPEM), que aconteceu em 2023. O trabalho, intitulado "PROJETO DE VIDA: DIFERENÇAS CONCEITUAIS ENTRE A BNCC E OS CURRÍCULOS IMPLEMENTADOS NO ENSINO MÉDIO BRASILEIRO", está disponível nos anais publicados no site, assim como, os demais trabalhos apresentados no colóquio. Por minha pesquisa se tratar ainda de uma pesquisa em estado inicial, os dados apresentados são preliminares.

    Em suma, é necessário compreender que a BNCC não dá conta de explicar, de maneira pormenorizada, o que seria o projeto de vida, para que serve, como fazer, onde buscar fontes confiáveis, etc. Tanto a LDB quanto a Base não trazem informações suficientes para dar nortes aos docentes e às equipes das secretarias de educação, o que acaba gerando todo tipo de discurso sobre projeto de vida, muitas vezes, incorretos e incipientes. 

    Desde a perspectiva "coach", com alta adesão ao paradigma neoliberal e de responsabilização individual pelo sucesso; passando pela percepção de que o projeto de vida é algo individual apenas, sem diálogo com os projetos de vida coletivos; ou o discurso psicologizante e até estigmatizante - misturando, assim, "projeto de vida" com "educação socioemocional" (que são muito diferentes!); ou, até mesmo, a perspectiva que o projeto de vida é algo que tem uma fórmula pronta e que é uma tecnologia de empreender a vida.

    Quem conseguiu ter acesso à fontes fidedignas, científicas sobre projeto de vida, sabe que não é bem assim. A oriegem de projeto de vida, ou projeto vital, tem raízes fortes ligadas à psiquê humana e habilidades cognitivas de prefiguração do futuro, tendo como ponto de partida o contexto atual da pessoa. Portanto, podemos dizer que projeto de vida tem seu "nascimento" na seara da psicologia e estabelece, em seguida, um diálogo importantíssimo com o direito, sendo entendido por este como um direito humano, ou seja, o direito de ter liberdade para pensar e projetar(planejar) a sua vida com liberdade e dignidade.

    Para poder trazer essa explicação de forma o mais completa e densa possível, deixarei para o próximo post o aprofundamento daquilo que chamo de referências necessárias para entender o que é e o que não é projeto de vida. Até lá! ☺


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